PROJETO:
UMA HISTÓRIA DO SÉCULO 19 PARA CONTAR:
RECUPERAÇÃO DOS MANUSCRITOS FUNDADORES DA CASA PIA ÓRFÃOS DE SÃO JOAQUIM
Este projeto “Uma história do século 19 para contar: Recuperação dos manuscritos fundadores da Casa Pia Órfãos de São Joaquim” foi financiado pela Secretaria de Cultura do Estado da Bahia, através do edital 001/2020, da Fundação Pedro Calmon, através do Prêmio Fundação Pedro Calmon, Programa Aldir Blanc Bahia, Lei Aldir Blanc, de autoria do Ateliê de Conservação e Restauração Memória & Arte.
A proposta era recuperar 3 livros atas (1826, 1869 e 1885) pertencentes ao acervo histórico da Casa Pia e Colégio Órfãos de São Joaquim, uma instituição multissecular da Bahia. Esses manuscritos representam nosso patrimônio documental e remontam à história de um dos primeiros espaços brasileiros a se dedicar à proteção de crianças em situação de risco, vagando pelas ruas da antiga Província da Bahia, e proporcionar-lhes educação, moradia e um ofício (para que pudessem se sustentar quando alcançassem a maioridade).
São documentos fundadores da instituição, por isso nos ajudam a esclarecer muitas dúvidas em relação à sua função de amparo e assistência infantil, todavia, por se encontrarem em avançado estado de degradação, necessitavam ser recuperados para que a fragilidade do papel não gerasse perda de informação e com isso fosse criada uma lacuna na memória histórica de tão importante instituição baiana.
O acervo da Casa Pia é constituído basicamente de manuscritos sobre a instituição, em um volume imenso. Enquanto tipologia documental, são classificados como Livros Atas e de Termos, possuem vários scriptores, que normalmente eram Escrivães, Provedores, Sócios ou Secretários da época, responsáveis pelas assinaturas e pela produção das atas.
A documentação aqui trabalhada é toda ascendente, ou seja, de pessoa física para autoridade, representada nas atas pelo Diretor ou Provedor da instituição na época. São documentos originais e únicos.
A originalidade foi constatada através de análises diplomático-paleográficas que consideraram a materialidade do suporte – como tipo de papel utilizado, presença de marca d’água e contramarca (típicos do período da escrita); presença de fórmulas e estruturas diplomáticas, elementos de validação, tipos caligráficos, características linguísticas, produzidos em português antigo; presença frequente de abreviaturas muito usuais para os tipos documentais e em seus respectivos períodos. Por ser manuscrito, é único e classificado como obra rara.
Em função do estado em que se encontrava a documentação quando a ela tivemos acesso, a conservação preventiva já não era mais possível. Percebemos que seria indispensável a ação imediata de um processo invasivo de restauração, que incluía a chamada “alteração do suporte”, quando há a intervenção direta do suporte, seja por haver rasgos ou craquelamento do papel. Tais ações foram indispensáveis para a preservação do maior bem contido sobre o suporte: a informação.
A documentação encontrava-se em avançado estado de degradação, escrito em tinta metaloácida, bastante ácido, mas de grafia perfeita, o que auxiliou na sua transcrição e posterior leitura, mas já apresentando perda de suporte. Era visível a migração de tinta entre os fólios e a oxidação da tinta metaloácida, provocando corrosão do papel. Eram perceptíveis também os ataques biológicos por insetos e fungos, além da degradação causada por condições ambientais (umidade e calor). Assim, esses 3 manuscritos foram escolhidos por serem do século XIX, muito frágeis, já se encontrando em condição de biodegradação. Recuperá-los era uma necessidade emergencial, pois eles remontam ao início da história da fundação da Casa Pia.
Nos documentos, essas intervenções foram diferenciadas: em alguns havia alta concentração de tinta devida aos movimentos da pena durante o ato de escrita; em outros, em uma tentativa de restauro anterior havia dezenas de fólios com papel manteiga colado, o que inevitavelmente leva o documento ao banho químico para a retirada desses papeis, que são ácidos e provocaram grande parte do estrago encontrado. Todos eles foram restaurados com papel japonês maruishi 9g, utilizando a técnica minimalista.
A transcrição seguiu os seguintes critérios: a grafia dos documentos originais foi mantida na íntegra, mesmo nos casos evidentes de lapso do scriptor; as abreviaturas foram desenvolvidas, sempre que possível sua decodificação, apresentando-se as partes omitidas no original em itálico; as abreviaturas que não puderem ser identificadas, foram mantidas conforme original; foram respeitadas as fronteiras entre palavras, separando-se o que estava unido no original e unindo-se o que está separado conforme a vigência gramatical atual; as fórmulas iniciais e finais de cada texto, quando possível, foram mantidas na sua disposição original; os danos no suporte que impossibilitaram a leitura foram indicados como [...]; as leituras feitas a partir de conjecturas foram incluídas na transcrição entre colchetes; aAquilo que não foi possível ler devido por falta de decifração da(s) letra(s), foi indicado por [†].